Glorinha – A criança que eu fui
Completando a sétima semana desta Série, hoje, vamos aos traçados da infância da nossa querida amiga Glorinha Leão do blog cafecombolo.
“Não somos seres suspensos em bolas de sabão, a vagar felizes pelo ar; há um antes e um depois nas nossas vidas, e esse antes e depois atamos destinos, caí em cima de nós como uma rede sobre a presa”. Susanna Tamaro
Nasci num parto difícil, mãe mais velha, quase 40 anos. Fui retirada à fórceps, achei que lá, do lado de dentro, era bem melhor e fui ficando…
Cresci amada por meus pais e irmãos, embora, minha irmã do meio, sete anos mais velha tivesse um ciúme enorme de mim, coisa que aliás, tem até hoje. De meu irmão, dez anos mais velho, quase não tenho lembranças, pois nossa diferença de idade foi um fosso entre nós, mas hoje em dia, somos grandes amigos. Tenho por ele um amor enorme.
Nasci e cresci no bairro de Laranjeiras, Zona Sul do Rio, mas uma Zona Sul diferente de Ipanema ou Copacabana, pois Laranjeiras era um bairro residencial, cheio de história e ruas tranquilas, onde se podia brincar sem pressa e sem medo.
A rua em que eu morava era uma rua de ladeira e, poucos carros passavam por lá. Eu sempre gostei de brincar e tinha muitos amiguinhos, embora na sala de aula fosse uma criança muito tímida. Mas não no recreio. Lá, eu me soltava em brincadeiras e conversas.
Por ser asmática, conseguia me livrar das aulas de educação física, que eu detestava. Pelo menos para isso, a doença que tanto me fazia sofrer, servia. Era excelente aluna. E português era minha matéria predileta, sendo mesmo, uma das melhores alunas da classe.
Em casa, era solitária, e, como meu pai tinha um grande acervo de livros e coleções, eu passava muitas e muitas tardes lendo os clássicos, escrevendo e refletindo sobre a vida.
Fui uma criança muito reflexiva e, desde que me entendo por gente, escrevia poemas em prosa e verso. Sofri muito com a asma em criança. Muito mesmo. Pois naquele tempo não havia os medicamentos que há hoje em dia. Era magrinha feito um caniço, mas esperta e ágil como todas as crianças normais. Fora das crises, a asma só me impedia de tomar gelado, coisa da qual tenho trauma até hoje! Não me dêem sorvete ou tomarei o pote até acabar! E hoje, como não sou mais um caniço…já viram, não é?
Era bastante infantil em alguns aspectos, talvez por ter sido a caçula e temporã, e noutros, era muito madura para minha idade. Depois que meu pai adoeceu seriamente, quando eu tinha doze anos, fiquei mais preocupada e pensativa do que já era, com coisas com as quais as outras crianças da minha idade não se importavam: guerras da Coréia e Vietnam bombas atômicas, guerra fria…Afinal aquele era um tempo em que as bombas nucleares ameaçavam a humanidade. Escrevia textos tão sérios que minha mãe foi chamada uma vez ao colégio, pois achavam que eu tinha algum problema em casa com meus pais. Realmente tinha, pois minha mãe foi uma mãe muito repressiva e religiosa e para ela tudo era feio ou pecado. E eu, já nesse tempo era uma revoltada com os estereótipos e o pré estabelecido.
Perdi meu pai muito cedo e numa fase importantíssima, quando tinha 15 anos, mas aí, já estava na adolescência e é papo para outra série.
Sempre fui à frente de meu tempo. Pra vcs terem uma ideia, casei de rosa, aos 20 anos, sem estar grávida. Isso em 1978!
Bem, a criança que eu fui, se reflete e muito, na mulher que sou hoje. Carrego as dores do mundo em mim, como carregava aos 12 anos. Sou feliz e atormentada. Há dias em que me sinto uma privilegiada e, no dia seguinte a mais infeliz do mundo.
Mas guardo muitas lembranças deliciosas de minha infância e da minha meninice. Aliás, pensando bem, lembrei de uma frase que uma amiga da família dizia sempre que me via:lá vem a Glorinha, a criança mais feliz que eu conheço! Porque eu vivia com um enorme sorriso no rosto.
Fui feliz sim, e muito! Pelo menos na infância…quando ainda não tinha a noção de que carregamos as tristezas pelo resto de nossas vidas, muitas superamos, outras, levaremos conosco até o fim de nossos dias.
Obrigada querida Glorinha por este compartilhar de vivências de sua infância.
Comments
chica
Adorei ver a Glorinha aqui.
Linda infância deve ter tido na linda Laranjeiras.
E acho que ela não contou ,mas deve er sido danadinha de arteira,srrsrs…
beijos às duas,chica
Giovanna
Adorei ver Glorinha aqui. A história dela sempre vem marcada pela presença forte do pai. Bjs pra duas: Glorinha e Norma.
Glorinha Leão
Oi Norma, obrigada pelo convite e por ter podido mostrar um pouco da criança que eu fui. Pensei na frase da Susana Tamaro que predede o meu texto: o antes e o depois cai sobre nós como uma teia…somos realmente um reflexo de nossa vida passada e muitas vezes ela nos enreda de tal forma que não conseguimos sair dela a não ser arrebentando essa teia, cortando, furando e desatando os nós que nos prendem ao passado. Venho tentando perdoar, sabe Norma? Mas nem tudo conseguimos sozinhos, sem ajuda profissional. Um dia, talvez consiga desatar esses nós que restaram. Grande beijo.
PS: Chica, fui levadinha, dentro do normal. Só fiquei danada mesmo foi na adolescência…hehe bjs,
josé cláudio – Cacá
Parabéns por mais esta agradável companhia da Glorinha aqui, Norma. E Parabéns à Glorinha também pela grande estatura humana em que se transformou. Abraços. Paz e bem.
Beth Q.
Ah, esta é minha amiga Glorinha, tão querida, engraçada, risonha, fofa, espevitada, encaracolada, invocada, pensadora e sonhadora!
Glorinha teve uma infância bonita e cuidada, nota-se pela fantasia primorosa de holandesa em que está neste carnaval.
Ela é mesmo uma pessoa até hoje, analisadora e introspectiva, por isso escreve coisas tão bonitas e sensíveis.
Criança asmática sofre muito e imagino o quanto sua mãe teve de trabalho com ela, mas acho que mesmo assim ela foi bem pimentinha e fez muitas artes. Olhem a carinha dela, que fofa e danadinha já era! hehe
beijos pra ela e longa vida!
Pra você, Norma, uma ótima semaninha e bjs cariocas.
Maria Helena
Querida Glorinha,
O sofrimento encarado com os olhos da sensiblidade é doloroso mas, ao mesmo tempo, é libertador pois nos dão asas para a poesia. Difícil entrar no mundo da arte sem ter experenciado o sofrimento ou a alegria na sua forma genuína. Os sentimentos paradoxais dão o equilibrio que você tem. Ter equilíbrio, minha querida, não é necessariamente ser um poço de silêncio nas horas críticas da vida, é também libertar as dores através dos gritos. A diferença é que os gritos são organizados em poesia, assim como você faz. Eu entendo o seu brado e admiro muito a sua autenticidade. Nem todo mundo tem coragem de tirar a máscara cotidiana e mostrar a nudez interior. Você é uma guerreira. Abraços carinhosos!
She
Obaaaaaaa, adorei! Cada um com a sua história, uns têm histórias tristes misturadas com alegrias, mas todo mundo tem a sua própria história e cada uma é unicamente importante e agregadora em nossas vidas, fora a viagem ao túnel do tempo que fazemos ouvindo, ou lendo as experiências dos outros… Adoro! 😉
Beijo, beijo para as duas!
She
Manuela Freitas
Querida Glorinha,
Com muito prazer pude conhecer mais alguma coisa de ti!
Então não querias sair lá de dentro!..E que seria o mundo sem ti? Sempre deixamos marcas nas outras pessoas, somos sempre um ser único e tu és um encanto como pessoa, com as tuas tristezas, com as tuas alegrias sempre de uma forma radical! Sensibilidade à flôr da pele!..
Sabes como te admiro e apesar de um oceano imenso que nos separa eu sou tua amiga e te prezo muito.
Beijinhos a essa menina tão «riquinha» vestida à holandesa e com um sorrizinho tão bonito.
Manú
manuel marques
A Glorinha é uma mulher extraordinária,tem um coração do tamanho do mundo,é directa ,sincera e muito querida.
Abraço.
ELIANA
Essa de ñ querer sair de dentro da mãe é bem coisa da Glorinha Leão engraçada rsrs
Norma adoro vir aqui ver todas essas mulheres realizadas e lindas contando suas histórias da meninice!
beijo
William Garibaldi
Que linda esta série!
Que legal conhecer a Glorinha menina! Que linda história e lenda desta mulher poderosa!
Uma grande sacada deste Blog que to descobrindo aos poucos ser ma-ra-vi-lho-so!
Bju
William Garibaldi.
Élys
Gostei de vir, aqui, mais uma vez ler a história de uma infância, pois, sempre tem algo a nos emocionar.
Glorinha chegou a pensar em nos privar de sua companhia ao nascer . Mas que bom que ela veio!…
orvalho
Olá, queridas do meu coração
Saber a história de cada uma é ficar mais feliz por valorizarmos a nossa… aprendemos muito!!!
Glorinha de muita reflexão, daria uma filósofa do século XXI… e será que não o foi a frente do seu tempo???
Tenham muita paz e fiquemos unidas nesses laços que a série nos tem proporcionado.
Parabéns, Norma e quando sairá a adolescente de cada um???
Avante!!!
Bjm às duas
Suziley
Boa noite Norma e também Glorinha:
Muito bom saber um pouquinho mais de você, Glorinha. Mas, sabe o que encanta em você, mesmo com as tristezas que todos nós carregamos, já desde crianças, é o seu belo sorriso no rosto. Não mudou nadinha. É o mesmo. Sorriso que nos ilumina!! Uma ótima semana a vocês, beijos no coração : )
Tida
Glorinha,
Você está lindinha. E deve ter sido muito feliz mesmo, já que está muito bem cuidada. E para a criança se sentir feliz precisa de bem pouco, só carinho, respeito, atenção e cuidados. E isto nos é mostrado nas fotos.
Norma,
Não sei se ainda vai dar para eu participar, pois na próxima semana tem festa na família, o primeiro aniversário da netinha. Tenho muito trabalho até lá. Bem que eu queria participar.
Bjos
Astrid Annabelle
Eu acredito Glorinha que essa criança vive alegre e forte todos os dias em sua vida bem aqui!
Eu vejo você assim!
Bela história de vida querida! Lindas fotos!
Norma mais uma amiga que conhecemos um pouco mais!
Parabéns por esta sua série muito interessante!
Beijo grande para as duas.
Astrid Annabelle
Cristiana
Lindo e emocionante o depoimento da Glorinha, pessoa a quem aprendi a admirar e respeitar, gosto de ler historias assim e vc está de parabéns Norma, todo ser humano não é um dia, somo todos uma historia sendo contada. lindo! bjs
Norma Emiliano
Querida Glorinha
Mais uma vez grata pela sua participação que nos trouxe tantos detalhes significativos da sua história de vida.
Agradeço também a todos que têm nos acompanhado, semanalmente, bem como aqueles que chegam a cada relato, enriquecendo com suas identificações e comentários.
A recepção foi além do esperaddo e fechei as inscrições.
No entanto ainda teremos quatro relatos, sendo da próxima segunda da amiga Giovanna.
Aguardo a todos.
bjs
Glorinha Leão
Norma querida e todos os que fizeram comentários aqui: ser verdadeira demais, comigo e com os que me rodeiam, tem seu preço. Pago um preço alto por isso, mas não me arrependo (algumas vezes sim, mas poucas). Ao mostrar-me, dou a chance a outros que têm seu íntimo lacrado, a se mostrarem também. Claro que não é por isso que sou assim, sou assim porque sou, mas venho notando que tenho quebrado alguns paradigmas e algumas barreiras que outras pessoas tem. Espero de alguma forma ajudar a quem precisa ser mais aberto da mesma forma que a cada dia, ao me mostrar, mostro também, um pouco mais de mim a mim mesma. Obrigada pela oportunidade. A estória de vida da Giovanna dava um livro, vai ser lindo ver seu relato. Parabéns pela série, Norma e a todos os que já se mostraram um pouco por aqui. Beijos a todos.
Tati
Sabia que este texto seria incrível! ontem não deu para vir, mas hoje estou aqui para prestigiar. Não falei que era o divã da Norma? Glorinha começou sua terapia. Sempre vejo esta necessidade de romper com as amarras religiosas. Incrível como esta experiência de vida aparece no Servidão Humana, de uma forma um pouco diferente, mas também em relação a esta severidade, ao TEMER A DEUS. Não há como criar pessoas de fé assim, não é? Glorinha, imagino a criança mimada que não foi, cuidada com esmero, como disse a Beth, basta olhar para esta fantasia tão caprichada.
Norma, esta série foi uma ideia genial, e as histórias são sensacionais!
Parabéns às duas. Beijos.
Isadora
Oi Norma cheguei um pouco atrasada mas em tempo. Essa série proposta por você é maravilhosa, pois sem dúvida o adulto que somos hoje carrega muito da criança que fomos.
Glorinha, amei a narrativa sobre a sua infância, o amor pelos livros, as transgressões ainda novinha, você mesma, revolucionária.
A reflexão tão nova, com certeza é o que te faz ser tão questionadora e não aceitar algo sem que vá de encontro com o seu ponto de vista.
Um beijo
Liliane Carvalho
Norma e Glorinha , meu carinho e admiração.
Fiquei encantada com a meninice da Glorinha e com o fato dela já ser tão profunda na infância.
O gosto pela leitura e pela escrita vem há muito tempo, então.
adorei saber que ela casou de rosa.
Um abraço Norma
Um abraço Glorinha.
Alexandre Mauj Imamura
Que relato bacana! ela é uma querida mesmo, sempre a frente do seu tempo e com uma grande visão de mundo.
gosto muito dessa amiga! a infância dela foi boa, o que gerou um grande ser humano.
bacana sua série, Norma!
bom dia
Luzia
Glória, achei lindo seu corajoso depoimento. Expressar além do “bom e correto”, é um ato de coragem consigo mesma.
Acompanho este blog há pouco tempo e sempre que aqui venho, aprendo com Norma e as pessoas que a acompanham.
Parabéns pela sua linda descrição…
Luzia