Histórias de vidas
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Processo Terapêutico
A vida não é a que cada um viveu, mas a que recorda e como recorda para contá-la.
Gabriel Garcia Márquez (2002)
Os terapeutas, em sua prática, têm possibilidade de entrar em contato com as histórias de vidas dos seus pacientes a partir do significado único que cada um atribui às situações, aos fatos e às interações. Este é um caminhar, num primeiro momento, sob o foco de luz do cliente, em que se articula ouvir, empatizar e acolher os sofrimentos relatados e observados na expressão do rosto e do corpo.
É importante ouvir atentamente e evitar interpretações precipitadas. Neste caminhar, não existem verdades únicas e não existem respostas prontas para quem solicita ajuda. Cada pessoa tem uma forma de ser específica, tem recursos e mecanismos de defesas, assim suas dificuldades e questões estão atreladas ao seu modo de ser e estar no mundo. Daí a importância de sua história de vida, do entendimento da trama desenvolvida no seio familiar, que constrói o saudável e o patológico. Na perspectiva da Terapia Familiar Sistêmica, parte-se da crença de que o que acontece com o indivíduo não resulta apenas do seu interior, mas também do incessante intercâmbio com o contexto no qual se encontra inserido. A terapia busca ressignificações da história cristalizada em direção a novas possibilidades.
A queixa inicial é o ponto de partida para o desvelamento da função do sintoma naquele momento do ciclo de vida do cliente. O sintoma e a crise são compreendidos como partes do processo de mudança. A relação de confiança e empatia constituem a mola mestra do processo de construção conjunta do tratamento.
O referencial teórico sustenta a prática clínica e constitui a base para o diagnóstico e tratamento, mas o estilo de cada terapeuta é único e as situações clínicas suscitam os recursos pessoais do profissional. Assim sendo, o terapeuta vivencia novos papéis, explora recursos pessoais que, associados com seu corpo teórico, constituem sua forma de ser como profissional. A criatividade e flexibilidade são fatores significativos para se encontrar a forma mais adequada para cada caso.
É um cruzar de histórias, sendo relevante que o terapeuta tenha como sua primeira ferramenta os seus próprios sentimentos despertados na terapia, ou seja, estar atento às ressonâncias entre a história do paciente e a sua própria história. Neste contexto, compreende-se a história do cliente, constituindo-se uma oportunidade específica para a mudança.
Norma Emiliano
Comments
chica
A função do terapeuta não deve ser fácil. Ouvir com a devida isenção as histórias de vidas que por ali passam. Tentar ajudar e se proteger para não se envolver muito! Lembro que quando os meus clientes chegavam ao escritório, umas mulheres não querendo separar-se, mas precisando, outras com crianças abandonadas, manter minha isenção era fogo… Acabei v´parias vezes chorando junto com elas. Assim, a profissão, além da falta de justiça que via, fazia mal, pois sofria com outros.Sou uma esponja! beijos,chica e linda semana!
marliborges
Olá Norma! Parabéns pelo texto e pela abordagem. Adoro esse tema e penso exatamente assim como você sinalizou. Sabes, a meu ver a única isenção que existe é a legal. Nas outras áreas do conhecimento não acredito na existência da isenção. Acho impossível ouvir com isenção. Exatamente porque aquele que ouve, embora seja um profissional, sempre tenderá a ouvir à luz de seus próprios critérios — profissionais ou não. De forma que, assim como a educação não é neutra, a terapia também não é, que ninguém se iluda. Afinal antes de ser um profissional o(a) terapeuta é uma pessoa humana que também tem sua própria história de vida. E se o terapeuta for do tipo empático, mais dolorida será sua luta interior. Eu sou assim, empática — mas não sou terapeuta, rsrsrs, nem poderia, rsrsrs –. Mesmo assim, na juventude abandonei o direito de família, porque eu absorvia os problemas dos meus clientes e tomava partido além do que o dever de ofício me exigia. Cheguei à conclusão que neutralidade é uma das utopias que quer fazer de conta que não é. Quer saber? Nem um simples relatório está isento de juízo de valor. Nem uma foto. Bjs, Marli
Anne Lieri
Norma,imagino como é dificil essa profissão pois não se trata de uma coisa pronta,mas de como cada individuo encara as coisas do dia a dia. Um excelente texto e muito esclarecedor! bjs e ótima semana,
Roselia Bezerra
Olá, querida Norma
Sabe, ao pé de ouvido vou falar-lhe: não ligo mais pra árvore genealógica pois os laços de sangue não são satisfatórios, muitas vezes…
Colocar um filho no mundo é a coisa mais fácil pra muitos de nós mas amá-los até o fim, é para poucos… tenho visto cada barbaridade que é preferível sermos filhos adotivos e amados…
Sei que me entenderá…
A Terapia e Deus são reveladores…
Bjm fraterno e quaresmal